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SENSE8: A sensacional série dos Irmãos Wachowski (SPOILER ALERT)


Trailer Legendado

(ATENÇÃO: o texto é longo mas vale muito a pena!)

[Sem spoilers] Uma DJ islandesa que vive em Londres; um policial de Chicago; um motorista de van de Nairóbi; uma empresária coreana que secretamente compete em vale tudo; um ator mexicano que esconde um segredo; uma farmacêutica indiana; um ladrão de cofres alemão e uma ativista transexual de São Francisco. São oito pessoas que não tem absolutamente nenhuma correlação entre si e Sense8, primeira produção de Andy e Lana Wachowski para a TV, promete unir estas histórias. E consegue muito bem.


Fato é que “Os Wachowski”, como agora se auto-intitulam, já estavam ficando com o crédito baixo após terem concebido Matrix e transformado o Cinema e a ficção científica em 1999. De lá pra cá foram poucas obras lançadas e quase nenhum sucesso. Mas Sense8 não é pretensioso como Cloud Atlas ou desastroso como Jupiter Ascending, tornando este o primeiro grande acerto da dupla como roteiristas desde V for Vendetta, de 2005.

Sense8 é difícil de explicar e provavelmente foi difícil conceber, pois envolve um complicado esforço multinacional em termos de logística de produção, já que a série se passa praticamente ao redor do globo e em locações reais. Como já sabíamos pelos vídeos promocionais, os oito personagens citados acima são sensates (traduzidos como “sensitivos”) e aos poucos descobrem serem capazes de compartilhar experiências e memórias entre si.


O grande mérito de Sense8 é justamente aquilo que poderá afastar muitos espectadores da tela da Netflix à princípio: a falta de explicação imediata para o que está acontecendo. O piloto do drama não é nada expositivo, assim como os dois episódios seguintes que foram disponibilizados para avaliação. A trama tem início quando a personagem inominada interpretada por Daryl Hannah (Kill Bill) comete suicídio e aparentemente “ativa” algo nestas oito pessoas, que passam a dividir uma conexão sensorial que começa com sons, emoções e sensações físicas e evolui para verdadeiras “alucinações reais” até certa ingerência na vida uns dos outros, mas sem seguir qualquer tipo de padrão.


Cada personagem possui uma história que é logo bem delineada e os episódios conseguem ao mesmo tempo apresentá-las e desenvolvê-las sem jamais perder o ritmo e de forma impressionantemente balanceada. Mesmo quando um ou outro personagem toma mais tempo de tela (como o policial de Chicago ou a DJ de Londres), aquilo acontece para servir à um avanço na série como um todo. Costurando através destas realidades temos o personagem de Naveen Andrews (LOST), inicialmente apresentado como “Jonas”, que possui um controle mais avançado de suas habilidades e apresenta o objetivo de guiar os sensitivos a caminho de algo maior.


Ainda que possua elementos já conhecidos do público, Sense8 passa a impressão de estarmos vendo algo inédito e diferente, reativando a experiência de assistir a Matrix pela primeira vez. Aqui, contudo, o grande trunfo não são os efeitos visuais, mas sim os recursos narrativos que fazem com que nos importemos com os personagens e seus problemas quase que imediatamente, somada à belíssima diversidade dos temas abordados. Destaque para a trama de Nomi Marks (Jaime Clayton), uma ativista transgênero que luta por direitos igualitários enquanto precisa ouvir sua própria mãe chamando-a pelo seu nome de nascença e a da executiva/lutadora Sun (Doona Bae). O começo é bastante promissor.


[Com spoilers] Toda boa obra de ficção científica que possui grandes doses de fatores “etéreos” como esta precisa seguir um conjunto de regras bem estabelecidas e que não devem ser quebradas. É isso que a separa de produtos descartáveis que exploram o sobrenatural, mas que a cada novo episódio introduzem elementos que ferem a sua premissa. Mas isso não ocorre aqui (ainda bem). Passados os primeiros episódios que estabelecem a trama e os problemas de seus oito protagonistas, Sense8 aos poucos vai liberando informações que melhor situam o espectador nesta realidade até que possamos compreender, como eles, o que são os sensitivos e quais são as “Leis” deste mundo.


Poderíamos classificá-los como “mutantes” pelas explicações de Jonas, mas a diferença genética desta espécie é tênue. Eles fazem parte de um “cluster” de pessoas que possuem uma leve mutação genética e que experimentaram simultaneamente a primeira troca de oxigênio ao nascerem (o que faz que todos tenham exatamente a mesma idade), independente de onde estavam. E por ser uma espécie capaz de compartilhar a dor, o sofrimento e as emoções, os sensitivos encaram a vida de forma diversa dos demais.


Por isso, os melhores momentos de Sense8 ocorrem quando os membros do grupo passam a se ajudar mutuamente como um grande organismo simbiótico e, independente de suas habilidades – artes marciais, interpretação, farmacêutica, treinamento policial, hacking e até mesmo tendências crimonosas -, cada um pode acessar o que o outro está vivenciando e contribuir em tempo real. Além disso, à medida em que esta noção de “compartilhamento” é ampliada no grupo, a série passa a ter as mais memoráveis e apoteóticas cenas, muitas delas embaladas por uma trilha-sonora eclética e contagiante (o fim do episódio 1×04 ao som de “What’s Up” do 4 Non Blondes é belíssimo).


Assim quando “Van-Damme”, por exemplo, precisa escapar de um bandido no Quênia, ele é ajudado tanto por Sun quanto por Will (e aquela cena com a van dando o “chute” na moto foi espetacular) e a habilidade em “mentir” do resignado ator Lito vem a calhar em um momento crucial na encruzilhada em que Wolfgang se encontra. Este, por sua vez, foi imprescindível ao ajudar na fuga de Riley justo quando eles precisavam de alguém destemido para realizar um determinado ato e assim por diante. É aí que Sense8 toca no tema mais universal e de fácil identificação por qualquer ser-humano neste planeta: a solidão e a necessidade que temos de ajudar e sermos ajudados. Ao constatarem que não estão sozinhos, aquelas pessoas se tornam verdadeiros heróis uns dos outros sem nunca terem pisado juntos no mesmo solo (e toda a mecânica do que os sensitivos podem compartilhar e a ameaça da organização comandada pelo Dr. Susurros tornam a série mais rica, mas sem perder o foco).


Repleta ainda de momentos catárticos como a de uma luta de vale tudo na Coreia do Sul que se conecta diretamente com um assalto à mão armada na África através de raccords temáticos, sem contar nas maravilhosas cenas de intimidade entre os sensitivos que vão desde uma experiência sexual compartilhada até a incrível sequência que revela como todos vieram ao mundo, o roteiro e a direção dos Watchowski se conecta à montagem e à produção impecável, fazendo de Sense8 é uma experiência televisiva intrigante, única e emocionante que evidencia a habilidade de seus realizadores em contar uma grande história. Essa é a melhor série que a Netflix pôs no ar até agora. Que venham mais temporadas!


Sense8 estreou sexta 5 de junho, em todos os territórios Netflix.

© 2015 por Pipocult - "Sou um nerd a mais tempo!" - Guttão Sorocaba

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